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“O Pato Selvagem” ganha vida no CCVF com elenco de luxo encenado por Tiago Guedes

No próximo sábado, dia 23 de setembro, às 21h30, o Grande Auditório do Centro Cultural Vila Flor, em Guimarães, vê subir ao palco uma intrigante peça, “O Pato Selvagem”, com texto do aclamado dramaturgo norueguês Henrik Ibsen e encenação de Tiago Guedes. Em palco, um elenco de luxo para materializar um texto complexo com uma grande questão que se impõe desde os primórdios da civilização: vale mais uma verdade que tudo destrói ou uma mentira que dá continuidade a uma vida normal. Tiago Guedes transporta para o palco esta história com um sublime sentido estético e com uma mestria singular que retira de um aclamado naipe de intérpretes grandes representações.

“O Pato Selvagem” é um dos mais aclamados textos do famoso dramaturgo norueguês Henrik Ibsen e, estranhamente, uma das obras menos encenadas do autor em Portugal. Um texto, escrito em 1884, que reproduz e leva ao limite uma fraturante questão moral que impõe uma reflexão profunda do público: é preferível uma verdade pura que destrói as pessoas ou uma mentira que as mantém numa vivência próxima da felicidade? Através da fábula, que é aqui a metáfora que reveste toda a história e que, de forma mais ou menos explícita, se encaixa em cada uma das personagens que constroem este enredo, percebemos então que as personagens sobrevivem à verdade numa condição diminuída, castrados da vida mais próxima da harmonia que poderiam ter tido caso permanecessem na ignorância da mentira.

Ibsen usa a fábula do pato selvagem que, ao ser ferido por um tiro, mergulha na água do lago até ao lodo do fundo e nele espeta o bico segurando-se às algas que lá existem de forma a não voltar mais à superfície, como metáfora para todos os temas que aborda nesta peça. O pato escolhe morrer em vez de sobreviver ferido, mas é salvo à força por um cão que o retira do fundo do lago, ficando destinado, dessa forma, a uma segunda existência, confinado num sótão de uma casa. Este drama em 5 atos defende a existência de “mentiras necessárias”, ou das ilusões que são precisas por vezes criar ou acreditar para que o nosso tipo de humanidade consiga sobreviver.

Gregers Werle, o filho idealista de um empresário corrupto, decide expor a vida dupla do seu pai, mas no processo destrói as pessoas que pretendia salvar. Gregers força os seus amigos, a família Ekdal, a confrontarem-se com a verdade das suas vidas, mas a verdade apenas serve para os afundar. Visão e cegueira, idealismo e vulgaridade, verdade e mentira. São estes os temas centrais de “O Pato Selvagem”. Através de um jogo constante de luz e de sombras, o autor criou uma história de consciência moral que aborda tragicamente a fragilidade humana, onde a felicidade é destruída pelo fanatismo idealista da verdade absoluta.

O primeiro clímax da peça dá-se quando o casal Ekdal, Hjalmar e Gina se confrontam com o seu passado. Nessa discussão vai-se revelando progressivamente a incerteza da paternidade da filha de ambos, Hedvig, até que através de uma carta surge a confirmação desse facto. O segundo clímax recorre a uma estrutura mais complexa de suspense clássico. Perante o repúdio de Hjalmar, a jovem Hedvig decide procurar refúgio no sótão com uma arma. E, depois, durante uma conversa entre Hjalmar e Gregers, onde este fala de Hedvig como se de uma traidora se tratasse, o som de um tiro invade o espaço. No prefácio do livro da peça, Maurice Prozor defende que “em nenhuma obra de Ibsen o caráter especial do seu génio se revela tão bem como em ‘O Pato Selvagem’, pois o antagonismo entre essas duas personagens em cena (Gregers e Relling) não é mais do que um reflexo do combate que se deu na sua própria alma (de Ibsen), e ao qual devemos a mais pessimista das suas obras.”.

A peça levanta, portanto, questões morais complexas com as quais todos, de uma forma ou de outra, nos vamos debatendo ao longo da vida. A mentira como um “bem necessário” e intrínseco à humanidade, a mentira que permite uma certa normalidade que torna possível o enfrentar da vida. A peça expande-se ainda para outras questões. Se esta verdade surge e sugere a pura crença na verdade absoluta acima de todas as coisas ou se, por sua vez, a personagem que a traz à luz do dia também não o faz com outros interesses, ainda que inconscientes, como um ato de vingança, sentimento também inerente ao ser humano perante certas situações limite. Muito para refletir nesta obra de Ibsen, cuja complexidade e frieza a tornou uma das mais louvadas do autor. O encenador Tiago Guedes traz, assim, uma refrescante visão estética para o palco e convoca um corpo de grandes atores para dar vida a um enredo rebuscado.

Fotos: DR
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