Entrevistas

Igor Sampaio: “O público do Porto é maravilhoso”


É uma referência na arte de representar. Aos 72 anos de idade, assume que o Alberto, em Dancin’Days, foi um bombom na carreira. Gosta das noites do Porto. Apesar dos longos anos de carreira, acabou por confessar, minutos antes da entrevista, que se sentia nervoso, pois nunca gostou muito de dar entrevistas, não gosta de se ver, ouvir, pois assume-se um autocrítico. Estreou-se como profissional em 1967. Apesar de se sentir um homem realizado, afirma que nunca gostou de ter rotina na sua vida e revela que a maior frustração na vida foi não ter seguido ópera, uma vez que o teatro declamado ocupou, na altura em que terminou o conservatório, muito do seu tempo.

Agência de Informação Norte – Vamos começar esta nossa conversa por falar da cidade do Porto e dos amigos que tem na invita…
Igor Sampaio – Tenho um carinho especial por esta cidade. Tenho cá muitos amigos, muitos deles da altura em que vinha cá trabalhar no Teatro Sá da Bandeira, no São João, no Carlos Alberto, tudo isso isso no tempo do Teatro Nacional.

Grandes memórias?
Tenho, tenho muitas e grandes memórias. Só, de uma vez, estive no Porto seis meses e meio, com o «Passa Por Mim no Rossio».

Como é que eram esses tempos?
Vou contar-lhe uma coisa. Eu continuo a adorar as noites do Porto (riso). E, como tenho cá muitos amigos, levam-me sempre para as noitadas e passo sempre noites maravilhosas. Recordo uma noite que estive no Porto num festival de tunas, que é realizado anualmente no mês de Outubro, e deram-me uma das noites maravilhosas da minha vida, que foi estar na ribeira, com as tunas à minha frente a atuarem para os padrinhos. Nunca mais esqueci essa noite inesquecível passada no Porto.

E o público é atento, como dizem?
O público do Porto é maravilhoso. É diferente do público de Lisboa, é mais quente, vive mais, vibra mais com o espetáculo e, se lhes apetece fazer comentários da plateia, fazem comentários na plateia e isso é otimo; numa comédia, então, é maravilhoso (risos).

Estamos a falar de quantos anos de profissão?
Comecei a fazer teatro amador ainda nos Açores e fiz a minha estreia em 1967, por altura do Natal, com uma peça de Natal, no Teatro Monumental.

Tem sido um homem feliz enquanto profissional?
Com certeza, faço aquilo que gosto. Tive uma passagem rápida pela ópera e, talvez, essa tenha sido a minha maior frustração na vida não ter seguido.

E porque não o fez?
O teatro declamado ocupou-me de tal maneira que, quando acabei o conservatório, nunca mais tive tempo de continuar as aulas de canto. Na altura, fui adiando, adiando e os anos foram passando.

O Igor é dos atores que teve carteira profissional…
Sim, é verdade. Quando acabei o conservatório tive a minha carteira porfissional.

Hoje essa carteira já não existe. Guarda ainda a sua?
Acho que já não existe. A minha já não existe (risos). Após o 25 de abril, rasguei-a, porque criámos um outro sindicato, que acabou por ser um erro muito grande, deviamos ter ficado todos unidos no mesmo sindicato, que ainda existe. Lembro-me de que, de raiva, desespero, rasguei e não considero que seja importante nos dias de hoje ter esse documento.

Quer com isso dizer que tem vindo a mudar muita coisa na sua profissão?
Mudou bastante. Portugal não tinha tantos atores, éramos uma família. Sabe uma coisa: eu nunca tive a necessidade de fazer ou apresentar em lado nenhum o meu currículo. Sempre tive trabalho. Tive que o fazer, pela primeira vez na vida, há muito pouco tempo e tive que pedir ajuda a um sobrinho meu nos Açores, pois não tinha nada documentado do que tinha feito. É dificil contabilizar as peças que fiz no Teatro Nacional, durante 22 anos que estive lá, entre 1979 a 2001.

A televisão veio trazer uma nova fornada de atores…
Sim, a televisão veio trazer uma nova fornada e bons atores, alguns são mesmo muito bons, pois, ao contracenar com eles, fico parvo e aprendo muito com esta malta nova.

Mas, afinal, o que é que aprende?
Principalmente, a ter o mesmo ritmo que eles têm, que é inevitável, temos que acompanhar porque, senão, vamos ficando para trás. Eles têm outra técnica diferente de representar, mais modernas, melhores ou piores não interessam.

Mas um ator sente-se bem no palco da televisão ou no palco do palco?
Olhe, não diga isso a ninguém. Mas eu continuo a dizer que gosto muito de fazer televisão (risos). Eu e o Nicolau Brayner éramos dos poucos atores, em Portugal, que assumiamos que gostávamos de fazer teatro, mas não por muito tempo. Eu sempre detestei ter horários certos, cumprir rotina, usar sempre o mesmo horário.

Isso aconteceu-lhe no Nacional?
E noutras companhias. Em televisão o texto é sempre novo, acabamos aquele dia de gravação, limpamos o disco rígido e toca a meter lá outro texto. No teatro isso já não acontece.

Mas como é que reage quando os seus colegas dizem lhe que o palco é que é a casa do artista?
É a opinião deles… eu gosto muito de fazer televisão.

Tem saudades de fazer televisão?
Tenho muitas saudades. Desde que tive um problema de saúde, as oportunidades não têm surgido. Estou vivo, mas eles não estão a escrever para pessoas mais velhas, algo que não acontece no Brasil.

Mas sente que é ou não um ator reconhecido?
Você, às vezes, faz umas perguntas um bocado difíceis. Sou reconhecido pelo público, não pelos políticos. Tenho pena de já não haver teatro na televisão. Faz falta. Fiz algum teatro na televisão e ainda era aluno do conservatório.

É mais fácil comprar um bilhete de cinema do que um de teatro?
É mais fácil, se bem que os cinemas também estão em crise (risos).

Mas posso concluir que, enquanto espectador, é um grande observador?
Sim, sou, sou muito atento, mesmo que seja um texto chato, desinteressante, não me levanto, não saio da sala nem adormeço.

Mas existe ou não o grande papel na vida do ator?
Não sou ambicioso e acho que peco por isso. Não sei se existe…

É a favor dos subsídios no teatro?
Claro que sou. Para fazer teatro, neste momento, quase que temos que pagar, mesmo por conta de outrém, ou, dificilmente, recebemos o dinheiro a tempo e horas. Entendo que se querem manter o teatro em Portugal, ou outro tipo de espetáculo, como a ópera, que para mim é um espetáculo mais completo, tem que subsidiar, faz parte, um país sem cultura não vale de nada. A cultura é necessária para um país.

Essa instabilidade é o mais dificil na profissao de um ator?
É. Eu não posso falar muito porque, felizmente, fui um dos atores felizardos que recebeu durante 22 anos 13.º mês, férias pagas no Teatro e na Revista, no Teatro Maria Vitória, que também era o único teatro do Parque, que pagava a tempo e horas. Agora, infelizmente, não podem pagar, porque não têm público suficiente e isso entristece-me.

Os atores são inseguros?
(Risos). Eu sou a pessoa mais insegura, o ator mais inseguro, sobretudo, quando estou a trabalhar em teatro, sobretudo, em teatro…

Mas tem medo de falhar?
Antes de começar um projeto, seja em televisão ou em teatro, tenho sempre medo de falhar, fico apavorado.

O Alberto, de DancinDays, foi uma grande personagem?
Foi uma grande personagem, sim. Aliás, vários colegas, no primeiro ensaio de leitura, diziam que eu tinha o melhor papel da novela (riso). Foi um bombom para mim. A personagem tinha sido interpretada na versão nos anos 70 pelo grande Mário Lago, que foi um ator brasileiro que já faleceu. Eu diverti-me muito em Dancin’Days.

E neste papel foi fácil partilhar a personagem com a Margarida Carpinteiro?
Foi, meu Deus, a Margarida é uma atriz maravilhosa.

Esta personagem era do Alberto que tinha um vício. Existem muitos Albertos em Portugal?
Muitos (risos), eu já tive uma fase dessas.

Como gostava de um dia ser recordado?
Como um ator honesto, que sempre respeitou o público e gostaria que me recordassem como um ator de passagem, como tantos outros, e que não se esquecessem de mim, totalmente.

Oliveira Marques

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